04 maio 2017

[Resenha] Persépolis - Marjane Satrapi


Marjane Satrapi tinha apenas dez anos quando se viu obrigada a usar o véu islâmico, numa sala de aula só de meninas. Nascida numa família moderna e politizada, em 1979 ela assistiu ao início da revolução que lançou o Irã nas trevas do Regime Xiita, apenas mais um capítulo nos muitos séculos de opressão do povo persa.
Vinte e cinco anos depois, com os olhos da menina que foi e a consciência política à flor da pele da adulta em que se transformou, Marjane emocionou leitores de todo o mundo com essa autobiografia em quadrinhos, que só na França vendeu mais de 400 mil exemplares.
Em Persépolis, o popular encontra o épico, o oriente toca o ocidente, o humor se infiltra no drama, e o Irã parece muito mais próximo do que poderíamos suspeitar.

Título original: Persepolis
Categoria: quadrinhos, HQ, política, biografia
Editora/Ano: Quadrinhos na Companhia/2007

* Livro cedido pela Companhia das Letras, para resenha


Baseado em fatos reais, esta é uma obra em quadrinhos que retrata a revolução popular que levou ao Regime Xiita no Irã, do ponto de vista de uma testemunha de todo o processo, que era apenas uma criança de dez anos quando tudo começou. Com ilustrações e texto da própria Marjane Satrapi, Persépolis nos traz o olhar de um nativo iraniano, e demonstra como esse regime extremista mudou toda a realidade de um país, sem os esteriótipos da visão ocidental.


Marjane, ou apenas Marji, era uma criança de 10 anos quando a revolução popular derrubou o Xá iraniano. Vinda de uma família politizada, com relações passadas com o governo do país, ela teve uma criação bem moderna. Por isso seu estranhamento e surpresa ao se ver obrigada a usar o véu, quando os Xiitas começam a assumir o poder. Acompanhamos a vida de Marji por aproximadamente 15 anos, nos quais vemos o endurecimento do regime, a guerra civil que acometeu o Irã, a guerra externa com o Iraque e a influência dos Estados Unidos nisso tudo, além dos atos de rebeldia de parte da população contrária as novas políticas.

Desde pequena Marji acompanha e participa de discussões políticas em sua casa, e conhece figuras interessantes relacionadas aos rebeldes e também aos comunistas. Tendo esse nível de liberdade familiar não é de estranhar que ela acabasse se manifestando na escola, onde não aceitava o discurso dos professores, alinhado aos pensamentos dos novos governantes. Por esse motivo, ela foi enviada para estudar na Áustria aos 14 anos de idade, onde passou por várias casas, pensionatos e chegou até a viver na rua, antes de retornar ao Irã, e posteriormente se mudar para a França.


Toda essa história é contada com diálogos inteligentes e um tom de humor irônico. A narração é bem dinâmica, e cada capítulo traz um tema que retrata uma situação que marcou a época. Eu demorei um pouco a finalizar a leitura porque o tema é bem pesado, além do fato de parar em vários momentos para pesquisar alguma situação mencionada no livro, que me deixaram curiosa. É interessante observar a mudança de percepção e comportamento da sociedade, o quanto muitos homens acharam conveniente essa subjugação feminina, a manipulação da mídia e o o pouco valor que se dá a vida em momentos de crise.

Persépolis é uma obra absolutamente fascinante, mas também bastante pesada. A autora soube retratar bem sua visão e percepção de acordo com a idade a cada momento. Desde a forma um tanto descontextualizada e romântica de uma criança até a adulta de coração livre e mente aberta que não aceitava o nível de repressão que passou a existir em seu país. É sem dúvida um livro de grande cunho feminista, que retrata bem a vida de uma mulher que vivia nas piores condições marginalizáveis para suas companheiras de gênero, mas que mesmo assim não se submeteu nem deixou seu espírito e pensamentos serem subjugados.


Os desenhos são incríveis, e repassam bem toda a dramaticidade da história contada, mas sempre com um tom de ironia e até mesmo um certo humor em vários momentos. O trabalho gráfico da Cia das Letras foi muito bem feito, com a adoção de folas brancas e mais grossas, uma vez que todas as ilustrações são em preto e branco, e num tom bem forte que poderia ser visível no verso, no caso de um papel mais fino. A tradução foi muito bem feita, e há breves notas no momentos necessários. Porém, creio que esse seja um livro que não apenas merecia, mas também precisava de uma edição capa grossa. 

Recomendo muito.

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